Sunday, March 9, 2014

O Renascimento do Patê (Pâté's Revival)



O Patê morreu por um ano dentro de mim, e na tela do meu computador. Morreu não, ficou em coma, em estado vegetativo. 
 No início de 2013, resolvi que iria iniciar um MBA, um curso focado em Marketing (que a princípio não tem nada a ver com Veterinária, que é minha profissão de formação, mas era a base dos novos rumos que eu havia dado à minha carreira). Dias e dias planejando minha rotina com o novo curso, até que um dia meu marido entra em casa e diz "recebi uma proposta de trabalho nos EUA, topa?". Como não era a primeira proposta que ele recebia, respondi tranquilamente para ele pensar o que seria melhor pra ele, mas no fundo pensando "dessa vez também não vai dar em nada". Ele respondeu: "ok, vou começar a me mexer então, pode ser que eu seja chamado para uma entrevista". Um mês depois, em Março de 2013, após alguns contatos telefônicos feitos entre ele e uma empresa americana, fomos chamados para passar um final de semana nos EUA. Seria a ocasião da entrevista dele, e uma oportunidade de conhecer a cidade que poderia se tornar meu novo lugar no mundo. A primeira impressão foi ótima: cidadezinha linda, arborizada, histórica - ok, pensei. Dá sim pra morar aqui.
 Após o super marido ser aprovado na entrevista de trabalho e depois de muita (muita mesmo) burocracia, papéis, consulados, seis meses depois estávamos com nossas malas e passaportes em mãos, dispostos a vivenciar essa aventura de viver fora de nosso país natal. 
 Muitos me perguntam o que faz com que alguém tenha coragem (e vontade) de deixar família, amigos e emprego para ir viver num lugar estranho. Não posso responder por outros, mas nós estávamos descontentes com a qualidade de vida que tínhamos no Brasil, e estávamos desfrutando de um medo absurdo do futuro, o de não conseguir juntar grana pra ter um apartamento melhor, não ter grana pra educar um filho numa escola brasileira de alto padrão. Temos um país lindo, mas extremamente mal administrado. Brasileiros pagam impostos altos que infelizmente não são investidos em nossas vias, em nossos hospitais, em nossas escolas. O dinheiro não chega em nossos cidadãos. Sim, como cidadãos talvez devêssemos pensar em ficar lá exatamente pra tentar melhorar nossa pátria, mas cá entre nós, esse patriotismo é lindo só na teoria e é de um amor pouco recíproco, se é você que está esperando atendimento no SUS. A oportunidade bateu na porta, e cá estamos nós.
 Sobre os quase seis meses iniciais aqui, posso dar minha visão, bem pessoal. Americanos são seres educados, gentis e diretos. Amáveis mas de difícil intimidade. Partilham de um trânsito organizado, não jogam lixo no chão, param para travessia de pedestres, não gostam de proximidade física com quem não conhecem, são loucos por esportes, adoram carros grandes e sanduíches maiores ainda e jamais vão tocar sua campainha sem serem convidados, a não ser que sejam Testemunhas de Jeová pregando num sábado de manhã. Tenho aprendido muito com eles e só tenho a agradecer a esse país que me recebe todos os dias tão bem. 
 Como ser emocional que sou, o único lado ruim dessa aventura se chama saudade. Tenho uma saudade doída dos meus pais, dos meus avós, de alguns amigos, do meu antigo emprego. Deixar seus lugares e suas pessoas provoca uma certa perda de identidade. Quem é você, sem o bar que vai toda sexta à tarde? Quem é você, falando uma Língua que não é a sua? Ainda sobre a nova Língua e sua nova rotina - como é pra você lidar com seus erros e com a perda de admiração que você demorou anos para construir nas pessoas ao seu redor? 
 Tenho um amigo querido que já morou fora, e ele me disse algo muito interessante: Morar fora faz com que a gente descubra quem realmente é. Segundo ele, não é que você se reinvente em um outro lugar. Morar em outro país é a maior pressão que você pode sofrer pra saber quem você é, como em uma aula real de autoconhecimento. Não se perca de si mesmo, essa é a lição.
 Tenho me encontrado (ou deixado de me perder) na minha nova cozinha. A partir de agora o Pâté vem com as receitas dessa nova fase e em dois idiomas, assim os novos amigos também poderão se tornar leitores. Sejam novamente bem vindos.

Rafaella

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 For one year The Pâté died inside me, and on my computer screen. It was not died, but was in coma, in vegetative state.
 In the beggining of 2013, I decided to start a MBA, a Marketing focused course (that has no correlation with Veterinarian Medicine which is my profession, but was the basis of new directions that I had given to my career). Days and days planning my routine with new classes, until the day my husband entered in our house saying: "I received a job offer in USA, wanna go?". It was not the first time he received an offer, so I thought: "this time is going to be the same and will come to nothing". He answered: "ok, I'm going to start working on it, maybe I'll be called to an interview". One month later, in March of 2013, after some calls between him and an american company, we were asked to spent one weekend in USA. It would be his interview and the oportunity to know the city that could be my new place in the world. The first impression was good: a beautiful little city, historical and full of trees - ok, I thought. I can live here.
 After my husband's approval in the job interview and after a lot (a lot, really) of burocracy, sheets, consulates, six months later we were with our luggage and passports in our hands, willing to live a life abroad.
 Some people have asked me about what makes a person want and be brave enough to leave family, friends and a job, going to live in a different place. I can't answer for others, but we were unhappy with our life's quality in Brazil, and we were experiencing a monstrous fear of future, regarding not having money enough to buy a better apartment, to pay for a child to be educated in a high standard brazilian school. We have a beautiful country, but with a bad administration. Brazilians pay a lot of taxes, that unfortunately aren't invested in our roads, hospitals or schools. The money doesn't go to our citizens. Ok, as citizens we should think to stay there exactly to make our country better, but just between us, patriotism is beautiful only in theory and is a not reciprocal love when you are in a lane at a Public Hospital waiting health treatment. The opportunity knocked our door, and here we are.
 About the almost six month we've been in USA, I can give you only my view, very personal. Americans are polite, kind and direct. Lovely, but with a privacy hard to run through. They share an organized traffic, they don't throw trash on the floor, they stop to give passage to pedestrians, don't like phisical proximity to those they don't know, they're crazy about sports, they love big cars and even bigger sandwuiches and they will never ring your
doorbell without being invited, with the exception of Jeova's Witnesses preaching on a Saturday morning. I have learned a lot with them and I'm thankful to this country that received me so well.
 Being emotional as I am, the only bad side of this adventure is called "missing". I feel a painful missing of my parents, my grandparents, of some friends and of my job. Leaving your places and your people causes a kind of lost identity. Who are you, without the bar you are used to go every Friday evening? Who are you, speaking a Language that is not yours? Also regarding the new Language and the new routine, how is to you to deal with your own mistakes and with the loss of admiration that you took years developing in people around you?
 I have a loved friend who had lived abroad, and he said an interesting thing: Living abroad makes you know who you really are; He said that you don't reinvent yourself. Living abroad is the highest pressure you can experience to realize who you are, like a self - knowledge real class. Don't lose yourself, that is the lesson.
 I have found myself (or I've tried to not lose myself) in my new kitchen. From now on the Pâté will show this new phase recipes and in two Languages (Portuguese / English), so the new friends can read it too. Welcome,

Rafaella


4 comments:

  1. Amor,
    Acho que o amigo sou eu,não? Que engraçado:eu ía justamente te perguntar o que levou vc a ir morar aí.Já tenho a resposta,praticamente personalizada!
    Te desejo muita,mas muita sorte nessas tuas caminhadas:a real e a virtual!
    Você já é um sucesso de gente!!
    Te adoro!
    Marcio

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  2. É você sim, claro! Quem poderia dar melhor leitura de tudo isso? Obrigada, sempre! Miss you. Bjs

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  3. Rafa, adorei a parte em que você descreve a opção de mudar de país! Eu ainda sinto muita falta de "pertencimento" ... Ainda não me sinto a vontade nesta nova casa e entendo seu sentimento.

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  4. O tempo vai tratar de abrandar muitas dessas coisas Dri, dos pertencimentos e das saudades. Pelo menos não estamos sós, temos uns aos outros! Bjs

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